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terça-feira, 7 de julho de 2009

Café Literário

"Um homem é o que ele lê, come e bebe na vida. Logo deve escolher a melhor leitura, a melhor comida e a melhor bebida, o café..." - Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832). Então, yome Um Café Enquanto Você Lê este BLOG!



Vários livros tratam de maneira aprofundada assuntos relacionados ao café, a influência do produto na economia nacional até deliciosas receitas que têm o café como ingrediente. Tendo surgido enquanto bebida com grande destaque no cenário mundial justamente no período em que efervesciam as idéias renascentistas, o café foi adotado pelos intelectuais e maiores pensadores do racionalismo e do iluminismo e continuou sendo popular entre as elites pensantes européias em períodos posteriores da história.

Não são poucos os depoimentos de ilustres escritores, políticos, filósofos, cientistas e artistas em favor do consumo do café em virtude de suas grandes qualidades. Honoré de Balzac, por exemplo, escreveu as seguintes linhas sobre o café: “O café cai-nos no estômago e há imediatamente uma comoção geral. As idéias começam a mover-se como os batalhões do Grande Exército no terreno onde a batalha ocorre. As coisas que recordamos surgem a todo o galope, de estandarte ao vento”.


O Café

Existe uma bebida, ao poeta mais cara,
Que faltou a Virgílio e que Voltaire adorava:
És tu divino café, cuja agradável bebida,
Sem perturbar o espírito alegra o coração.
Mesmo agora, que meu paladar está embotado pela idade,
Com prazer ainda saboreio tua bebida.
Como gosto de preparar teu néctar precioso!
Em minha casa ninguém me tira essa tarefa deliciosa.
Sozinho reviro teu grão no torrador quente,
Ao ouro de tua cor faço suceder o ébano;
Eu sozinho contra a noz, que arma seus dentes de ferro,
Faço, no moinho, gritar teu fruto amargo,
Seduzido por teu aroma, infundo à minha casa,
As nuvens de teu pó fecundo,
Alternadamente acalmando e estimulando tuas bolhas de fervura,
Sigo atentamente seus rápidos turbilhões.
Finalmente, de teu licor lentamente descansado,
Na jarra fumegante a borra se deposita,
Minha taça, teu néctar, o mel americano,
Que do sumo da cana espremeu o africano,
Está pronto: a louça do Japão recebe teu líquido,
Somente tu reúnes os atributos dos dois mundos.
Venha, então, divino néctar, venha então me inspirar.
Quero apenas minha Antígona e a ti na solidão.
Mal senti o teu vapor odorante,
Subitamente o calor penetrante de teu clima
Revela todos os meus sentidos, sem perturbação, sem confusão,
Meus pensamentos mais harmoniosos acorrem em abundância.
Minhas ideias eram tristes, estéreis, vazias;
Agora riem, saem ricamente adornadas,
E creio, do gênio que prova o despertar,
Beber em cada gota um raio de sol.

Jacques Delille poeta e tradutor francês (1738-1813)

Navegação

CANTO VI

Recordem Clieu. Em seu navio ligeiro
Viajou o tímido arbusto de Moca:
De repente a onda cai, Zéfiro não tem mais fôlego;
Sob os fogos do Câncer a água pura das fontes
Se esgota, e da lei inexorável da necessidade
Do pouco que ainda me resta mediu o emprego.
Todos temerosos de provar as tormentas de Tântalo;
Clieu sozinho as desafia e, de uma sede fatal,
Que o ardor devorador a todos asfixia,
Enquanto um céu de bronze inflama-se de esplendor,
Do úmido elemento, que recusa a sua vida,
Gota a gota ele alimenta uma planta querida.
A aparência de seu arbusto alivia todos os seus males;
Clieu sonha já com a sombra de seus ramos,
E crê, acariciando seu tronco reanimado,
Respirar em bebida seu grão perfumado.

Joseph-Alphonse Esménard poeta francês (1769-1811)

Villanelle

Numa taça de velhos Sèvres
Derrame o moca torrado,
Perfume que deleita os lábios!

Oh, café! Quanto tu me excitas,
Vejo um mundo que enlouquece,
Numa taça de velhos Sèvres.

Graças a ti, como as cabras,
Meu verso salta, resplandecente,
Perfume que deleita os lábios!
Corre como as lebres,
E encontra um ritmo atrevido
Numa taça de velhos Sèvres.
Deixa os estômagos afetados;

O café convém ao galante,
Perfume que deleita os lábios!
É o ouro negro que os ourives
Procuram num olhar trêmulo
Numa taça de velhos Sèvres.
Perfume que deleita os lábios!

Charles Monselet poeta, jornalista, romancista, cronista e gastrônomo (1825-1888)

Café com Pão

Café com pão
Café com pão
Café com pão

Virgem Maria que foi isso maquinista?

Agora sim
Café com pão
Agora sim
Voa, fumaça
Corre, cerca
Ai seu foguista
Bota fogo
Na fornalha
Que eu preciso
Muita força
Muita força
Muita força
(....)

Manuel Bandeira poeta, crítico de literatura e de arte, professor e tradutor brasileiro (1886-1968)

O Café dos Emboabas

Os emboabas entraram
Na fazenda dos paulistas
Os paulistas, de sabidos,
Mandam servir o café.

Não é café que eles querem,
Eles querem, mas gemada
Batida com gema de ouro.
Tornaram a pedir gemada,
De novo lhes dão café,
De novo eles recusaram.
Os emboabas se danam,
Puxam o revólver do cinto./
Vão recuando, recuando,
Até nas margens do rio.
O dia inteiro lutaram.
Descansam de noite um pouco,
Pros paulistas vem café,
Os emboabas avançam,
Pedem um pouco de café,
Os paulistas recusaram,
Não lhes dão café afora
- Agora é tarde demais -
Os emboabas, furiosos,
Avançam para os paulistas,
Gritam,: “Depois do café
Se costuma beber água”,
Se embolaram com os paulistas,
Atiraram eles no rio,
Lhes dão água pra beber,
Toda vermelha de sangue,
Na cuia do rio das Mortes.

Murilo Mendes dentista, telegrafista e poeta brasileiro (1901-1975).

Infância

Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia
Eu sozinho, menino entre mangueiras
lia a história de Robinson Crusoé,
comprida história que não acaba mais.
No meio-dia branco de luz
uma voz que aprendeu
a ninar nos longes da senzala
e nunca
se esqueceu
chamava para o café.
Café preto que nem a preta velha
café gostoso
café bom.
Minha mãe ficava sentada cosendo
olhando para mim:
- Psiu... não acorde o menino.
Para o berço onde pousou um mosquito
E dava um suspiro... que fundo!
Lá longe meu pai campeava
no mato sem fim da fazenda.
E eu não sabia que minha história
era mais bonita que a de Robinson Crusoé.

Carlos Drumond de Andrade poeta, escritor e cronista brasileiro (1902-1987).

Ode ao negro café

Querido, quente, bom café negro
Seja mouro, turco ou sérvio verdadeiro
Ou ainda sabe Deus de onde venhas,
Nobre feito em casa ou não;
Quando te vejo diante de mim,
És somente um bom, fumegante café.
Deves saber e realmente sabes
(talvez não o nosso leitor)
que sem ti não poderia trabalhar
minha mente falha ao funcionar:
para mim muito pior seria
se sobre esta escrivaninha
não estivesse um bom café.
E esta rima sem sentido
De trabalhar com funcionar
É realmente surpreendente.
Muito claro, estou fraco
E o motivo é patente:
Não tomei café suficiente!
Mas para isto, um remédio
Tenho e ponho mãos à obra.
A rima atropela o sotaque,
mas o café, negro e quieto
Nos deixa alerta para o ataque,
Cumprindo papel de mandraque!
Verta-o, amigo, garganta abaixo
Mas não o faça somente uma vez,
Porque ele transforma a noite em dia
Faz como o forno, o café
Manda o calor bom para dentro,
Nos protege do frio de fora.
Palpitação dizem que causas,
E ainda insônia e que destrói os nervos.
Mas não sei qual o prazer que se goza
Nesta terra impunemente,
Que a saúde não te roa:
Ninguém pela vida passa à toa.
Dinheiro, glória, amor,
Tudo no mundo é monotonia.
O destino encarcera tua pressa
Dentro da mesma morsa todo dia.
Mas basta aquele aroma conhecido
Pra retomar o passo perdido.
Me afasto do ser negativo
Que sussurra bem de mansinho:
A cafeína é uma ameaça,
Mas o que ganho ao viver?
A vida é somente doença
Que nos leva à morte e além!
Até o juízo final, imerso no meu papel
Só sei que serei fiel
Ao meu bom e negro café.

Friedrich Torberg escritor, crítico e jornalista austríaco (1908-1979).

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