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terça-feira, 31 de agosto de 2010

Homens erguiam sacas de café...

imagem: Imigrantes empregados na estiva do café, no porto santista: até 320 kg (6 sacos) nas costas.
                                     Foto: cartão postal da primeira metade do século XX
                                         

A vila de Santos (SP), fundada no século XVI mostrou até o século XIX uma fisionomia provinciana, aspecto que foi alterado com a exportação do açúcar no século XVIII, mas só o café despertou Santos para  a necessidade de aparelhar o porto para a exportação cafeeira... (Fonte: Novo Milênio - O relacionamento entre essa monocultura e o fluxo migratório, e suas influências em Santos, são os temas centrais da monografia, publicada no livro: Café - Santos e História - vários autores, Editora Leopoldianum/Universidade Católica de Santos, Santos, 1995)

UM ASSOBIO
Lídia Maria de Melo*

Minha cidade mudou de cor.
Já foi vermelha, desbravadora,
mais que temida: foi respeitada.
Minha cidade tinha
um característico viço incomum.
Homens erguiam sacas de café, de açúcar
e tantos outros produtos
que garantiam sustento digno.
Minha cidade era de brios.
Já foi grevista, polêmica,
operária, dona de vida à toa na beira do cais,
artística, intelectual,
poética, teatral,
vanguarda política e musical.
Minha cidade foi palco de eternos
e heroicos dribles,
célebres conquistas,
inesquecíveis vitórias.
Gerou discursos, comícios,
inflamadas assembleias.
Inspirou prosas e versos.
Minha cidade já teve siso, ares sombrios...
Minha cidade sempre se defendeu.


Nos últimos tempos, minha cidade contraiu
uma palidez preocupante,
uma cruel anemia.
Minha cidade ficou branca.
Mas não com ares de paz.
Seus meninos tombam, abatidos,
ainda no vigor dos hormônios.
Minha cidade virou manchete
na internet, rádios, jornais
e emissoras de TV.
Minha cidade perdeu o sono
e morre de medo.
Minha cidade anda doente,
necessitada de intensivos cuidados.
Minha cidade precisa
é recuperar o bom humor de um assobio.

                                                                   *Lidia Maria de Melo
Jornalista, Professora Universitária e Escritora escreveu os livros: 'Raul Soares, Um Navio Tatuado em Nós' e 'A Garra de Uma Leoa', os contos 'Como Um Poeta' (antologia 'Contos - Unicamp Ano 40') e 'Bala Perdida' (Prêmio Vladimir Herzog) e reportagens (jornais 'A Tribuna' e 'Cidade de Santos' e revista 'Nova Escola'). Tem romance, poemas, contos, ensaio e músicas ainda inéditos...

PS: Poesia reproduzida com autorização da Lídia. Obrigada!

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